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Há toda uma sociedade profundamente preocupada com as últimas imagens de Jack Nicholson na varanda.
Imagine-se um tipo de 85 anos acabado de acordar. Depois espreguiça-se e decide ir apanhar um pouco de ar. Ouve-se o chilrear de pássaros. Sentado, gesticulante, olha em volta. Em seguida, enfim, não tão em seguida, desconfiando de uma elipse pouco subtil, para não dizer tosca, levanta-se e observa um helicóptero que passa. Até que, ao que parece, volta a sentar-se. Isso já não vimos. Alguém decidiu que era mais do que suficiente.
Ah - velhote intemporal!
THE END
Prof. Victor Bergman
Uns quantos e lambuzados porquês, projetados em múltiplas direções e logo devolvidos entre obstinações e suspiros. Ligeira pausa. Espaço: 1999, digo uma e outra vez, mudando ligeiramente o tom, e depois sorrio - como uma pista, cujo significado está apenas ao alcance de alguns privilegiados, que se solta e esvoaça.
Espaço: 1999 (!) Continuo a sorrir - a exclamação como cunho pessoal, uma vaga sensação de poder, servida trocista numa espécie de bandeja de bits.
Espaço: 1999. Dois, por assim dizer, agora na mais profunda agitação, trilhos paralelos a operarem dentro da mesma Moonbase: Alpha. Duas temporadas separadas por algo mais que matéria escura. Sempre que a Espaço e dois pontos se seguir 1999 a proposta é singular e unívoca: a primeira temporada. A memória resiste, como o sabor das nêsperas roubadas do pomar da vizinha antipática ou o japonês arrastado e iconólatra de Conan, o Rapaz do Futuro, e a profunda desilusão também, para mal dos nossos pecados. Logo, e quanto a este minúsculo pormenor a partir daqui o silêncio, Espaço: 1999 começa e acaba na primeira temporada.
Preâmbulo:
A 13 de Setembro de 1999, na sequência de um acontecimento nuclear catastrófico (e amplificado à potência S dos sonhos-loucos), a Lua é expelida da órbita terrestre e destinada a vaguear pelo Universo, qual nave espacial à deriva, com 311 habitantes a bordo, vagabundos espaciais na tal Moonbase.
Viagem solitária, expiatória, exploratória, retórica, dialética, errante, harmónica, dissonante, ilógica e divina. Antecipo, e não devo.
De entre esses 311, Victor Bergman, PhD, nascido a 27 de junho de 1940 em região incerta, vencedor de Prémio Nobel em categoria igualmente incerta, braço direito e lóbulo frontal do novo, e ao mesmo tempo eterno, Comandante da base lunar devaneante, John Koenig. Uma primeira passagem do bom professor pela base terá redundado em fracasso, culpas no cartório mais ou menos justas, enfim, um passado pouco esclarecido e só vagamente abonatório (PhD e Nobel vs. desastre nebuloso com um nome e um ano: Ultra Probe Mission, 1996). John Koenig, 17 anos mais novo, e também ele implicado no fiasco da UPM, não teve um percurso menos sinuoso: por exemplo, nos seus tempos de piloto-astronauta terá sido forçado pelas circunstâncias a tomar uma decisão que implicou a morte de 14 pessoas. Sabe-se que sem culpas no cartório, e auxiliando muitas mais pelo caminho.
Mas quanto a isso, a devida água correu e desapareceu em foz esquecida, o ano que conta é 1999. Glorioso futuro de um certo passado. Dois tipos do porvir com a aura do devir, portanto. Seja como vida, espírito ou metáfora. Uma, algumas ou todas.
Ah, louca e gloriosa existência! – o regresso dos amigos de longa data a Alpha coincide com novo acidente, este ciclópico, de dimensão cósmica, e tais percursos são assim duplamente irónicos e não eximidos de perplexidade: de acidente em acidente até ao delírio total (com o sentido de fim-último na escala de Desastres). E é por esses olhos, tanto dados à grandeza como à tragédia, olhos em parte de criança, que observaremos a viagem. Espreitam o desconhecido, e Koenig (bravo, porém preventivo capitão-da-guarda) questiona: “Victor, o quê?”; Victor sorri brevemente e coloca a mão sob o queixo, “Well John”, então reflete e antecipa: “Black Sun”, “antimatéria”, “ecos”, “magnetismo” …
Recordo um dos porquês devolvidos na noite, suposta armadilha, que advertia para a ineficácia do argumento. Era armadilha, e o autor desse porquê acabara de nela ficar preso. Isso mesmo lhe garanti. Não se tratava de ciência. Tratava-se de: amizade; pureza de espírito; desordem existencial; prazer em descobrir; ou seja, precisamente de libertar a mente das grilhetas da eficácia.
A ciência sempre fora para aquela amizade aventureira cárcere, prisão que gerara erros, erros que geraram acidentes, acidente que finalmente libertara a Lua, bem como a amizade, para a (sonhada) quimera. Sim, ao “O quê?” de Koenig, Victor retorquia “Black Sun!”, para acrescentar sempre um “Quem o pode verdadeiramente saber!?” jovial, respeitoso para com os mestres, deleitado perante o desconhecido, corajoso e cortês para com o distinto. Simples e fora de moda. Franco e constitutivo. Quanto à dúvida que, entretanto, os possa assaltar: mas não era objetivo dos selenitas regressar à Terra? Presumo da réplica óbvia: Queriam Scott, Cook, Livingstone, Ponce de Leon, Magalhães realmente regressar? Logo no segundo episódio, encontram um planeta habitável do tipo-Terra, e, da morte, alguém íntimo os avisa para os perigos daquele lar de aspeto tão saudável e familiar. Rejeitam o aviso, descem à superfície do planeta e deparam-se com um mundo de antimatéria, um negativo de rosto idêntico e com propósito sinistro. Essa viagem, adequadamente, ostensivamente, não tem regresso nem desejo de regresso.
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