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Qualquer um reconhecerá que Richard C. Sarafian não é lá grande nome para quem quer vingar num lugar tão dissimuladamente selecto (ou será o inverso?) como Hollywood, mas não foi por isso que a carreira de Sarafian, apesar de longa e…farta, foi actor e realizador entre 1956 e 2007, não chegou verdadeiramente a despontar.
Ainda assim, o realizador importa muito mais do que o actor, pelo que o período a fixar é o de 1962-1990.
O seu filme mais reconhecível, produzido em 1971, (ainda) é The Vanishing Point (um – primeiro e único e relativo – sucesso, e somente em segundas núpcias, meses após uma primeira estreia pouco auspiciosa). Filme com os defeitos e qualidades do costume na obra de Sarafian – que pelo menos sabe que para uma determinada época, seja ela qual for desde que os produtores e espectadores a reconheçam como sua (sem olhar para trás, os filmes de época apenas valem como simulação – veja-se o melhor filme de época de sempre, Age of Innocence, de Martin Scorsese, que mesmo inspirado num romance excepcional escrito por alguém desse tempo, vale-se de uma universalidade – fraquezas, fugas, liberdade desejada e inatingida, relações de poder, etc. –, que o faz pertencer a qualquer tempo), o cinema apenas pode ambicionar ser sintoma, talvez prenúncio seja melhor palavra.
Sarafian não é genial, sabe colocar a câmara, mas não edita ao mesmo nível. São os grandes temas e o corpo da história que conduzem o ritmo, não a montagem. Mas, obviamente, também não foi essa a razão do seu insucesso.
Para além disso, nos seus filmes dos early 70´s, a metáfora é demasiado expressiva, o que não combina com a porção de pendor realista dessas obras, mas já combina melhor com os seus elementos líricos – são filmes como que divididos ao meio (não a meio) entre esses dois mundos, por assim dizer.
Dito e confirmado o anterior, houve um momento que o seu cinema foi verdadeiramente singular. Um instante de criatividade onde todas as regras de apreciação bruscamente se subvertem. O ano: 1973. O filme: Lolly-Madonna XXX (os três X referem-se ao símbolo para beijos no final das cartas de outro tempo e não a qualquer desregramento idealista ou expressionista ou impressionista ou rococó de cariz sexual).
Pode um filme imperfeito ser considerado uma obra-prima? Sim, um inequívoco sim. No que a arte e a vida têm de humano, i.e., se afastam do divino, claro que sim. Há por lá um espaço aberto à contradição que cada um ocupa como pode. Se o ocupar séria e profundamente, então a obra-prima é possível na imperfeição.
(Aos forçados e inibidos que ainda não viram o filme, uma sugestão: ler + sinopse)
Imperfeito porque – o quadro inicial, do qual vem o título do filme, é pouco verosímil e provoca rejeição, uma vez que – excluída a hipótese redentora da provocação – nos incompatibiliza com as personagens. O que não é justo nem para com elas nem para com o filme. Só muito mais tarde, no contexto do absurdo violento em que o filme se escora, se entende a tomada de posição dos Feathers (ou seja, porque mantiveram Lolly Madonna – Ronnie Gill cativa contra toda a lógica). Isto retira momentum ao filme, e apenas serve para lhe dar um começo – voz-off real e metafórica que soa a passar a mão pelo lombo do espectador, digamos. Talvez se Lolly - Ronnie aparecesse depois de algum reconhecimento pelos terrenos do filme, pudéssemos partilhar afinidade e humanidade na sua ligação às personagens sem que se sentisse o peso do tempo que passou como tempo perdido (20-25 minutos de filme em 103, convenhamos que são demasiados para que se possam deitar a perder).
Obra-prima porque – uma vez alinhados com o filme (não obstante o que já se disse, valha-nos o que se pode fazer em 80 minutos), a estranheza – desassossego, assombro, espanto, escolham o sinónimo que mais vos convenha, juntem-nos em delírio, não importa – começa a prevalecer sobre o absurdo. Há uma atmosfera de autofagia que num primeiro olhar faz lembrar O Anjo Exterminador, de Buñuel, e com esta é a segunda vez em menos de uma semana (a outra foi Climax, o último de Gaspar Noé). Não é o pedaço de terra que importa (pois nada de produtivo vemos fazer dele, enfim, serve para guardar porcos), mas a impossibilidade de a abandonar. Quem lá habita não teme perder solo, mas sim enfrentar o vazio de negritude que adivinha para lá do universo conhecido. Espécie de cegueira que arrisca pressagiar o que não vê, efeito religioso num filme que não devolve qualquer eco de fé reconhecível, não há uma única referência a qualquer Deus naquele estranho e equívoco universo de hillbillies. Há sonhos, mas apenas nos mais jovens, nos filhos. Reservas e reflexão de igual modo são apanágio desses filhos. Unicamente desses filhos. Os pais revelam-se figuras desconformes, obscenas, hirtas, abissais… Se existe um inferno que reproduz as relações entre seres de diferentes estatutos, Lolly-Madonna XXX é a sua alegoria perfeita – o facto de se tratar de pais e filhos só aumenta a medida do sorvedouro que acabará por os arrastar. Poucos filmes foram tão longe na exposição dessa quebra. E tão líricos na omissão da memória longínqua dessa terra primordial, cuja posse já nada significa de palpável, se é que alguma vez significou. Se algum nível de compreensão subsiste, é o do vazio de sentido na posse, expresso no olhar das figuras paternas – olhar distante, incapaz de se fixar a não ser pela violência física (Pai Feather) ou pela abstracção alheada, não menos violenta do Pai Gutshall. Vai dar ao mesmo. Ambos veneram filhos “mortos” e desprezam os “vivos”, ambos se acobardam quando agir se torna inevitável, ambos no Inferno dos Vivos depois de terem enviado os seus para onde caem os Mortos - há quem lhe chame Vale; outros, menos dados ao visualismo, Esquecimento.
Não recordo outro filme assim, que com tanta dor, lirismo e omissão poética desfaça tanto os mitos americanos da posse da terra e a família nuclear (que alguns confundem com a visão de Cristo, omitindo para si mesmos, afinal há quem consiga esse prodígio, que Cristo também é dor); enfim, quanto à terra, talvez Heaven’s Gate, de Michael Cimino.
Pela comparação precedente, como é bom de ver, esperava-o obviamente o fracasso de público e crítica (a crítica da época no liberal New York Times é particularmente demolidora e mal intencionada), pois certas coisas, para certas consciências territoriais, pura e simplesmente não se podem deixar passar.
Lolly-Madonna XXX, tão esquecido que hoje pode ser encontrado sob dois nomes (também como The Lolly Madonna War, o título do romance no qual se baseia), é o tipo de produção que, em Hollywood, só se encontra algures entre 1966 e 1982. E é, sem reservas, mesmo se encostado a um canto, uma das maravilhas imperfeitas dos 70’s, ou seja, da New Hollywood, que sem pudor ou receio deveremos apelidar de obras-primas sem temer a evidente contradição de termos. No fim de contas, somos pouco, porém mais do que um mero sistema lógico.
Para finalizar, veja-se o casting – é, também, tempo de salivar por um tempo que já não volta: Rod Steiger e Robert Ryan (os pais), Katherine Squire e Tresa Hughes (as mães), Jeff Bridges, Scott Wilson, Ed Lauter, Gary Busey, Randy Quaid, Joan Goodfellow (os filhos) e a estreante Season Hubley, como a imaginária Lolly Madonna, quatro anos antes de Hardcore, de Paul Schrader, onde haveria de dar corpo a uma das mais trágicas personagens que recordo.
... depois do absoluto ridículo que foi a transformação de Freddie Mercury em cartoon recreativo vale a pena ter algum tipo de esperança sobre o biopic de Elton John, já que nenhuma podemos ter sobre a sua música?
Duvido muito, apesar do meu mui amado R Restricted.
“One of the lost masterpieces of the Hollywood left”, mais coisa menos coisa, é desta forma que Zizek começa o pequeno trecho sobre They Live (1988), de John Carpenter, no seu último documentário sobre cinema, The Pervert’s Guide to Ideology.
Curiosa (e, enfim, aceitemo-la como natural para quem viu o filme e se ficou pela superfície, a espuma das grandes ideias da qual saem convincentes resumos para um público expectante de significantes e desesperado por luzes ao fundo do túnel – e claro que não é só isso o que Zizek faz, apenas começa como lhe importa começar) a tentação de colar o filme a um ideário de esquerda, sinónimo de estado natural de rebeldia construtiva, filme que por acaso emana do coração da maior indústria alguma vez criada dentro da cultura e do entretenimento, verdadeira oficina de criação de super-heróis - e um mundo com super-heróis é, por definição, um mundo conservador.
Nas primeiras imagens, vemos surgir John Nada como se regurgitado pelos arrabaldes da grande metrópole, Los Angeles. John Nada, João Nada, João Nothing, em suma, Zé Ninguém.
Tenta arranjar trabalho, e dá-se ao trabalho de começar por onde deve, inscreve-se na segurança social. Desde logo parece certo que está por sua conta. Ajudas regimentares, nem oficiais nem oficiosas. Os serviços públicos excluem-no do mundo dos homens dentro do sistema com um ou dois simples olhares e os outros, os da margem como ele, simplesmente mais organizados, não têm espessura suficiente para estabelecer um relacionamento ou já se habituaram ao estado de dormência. Surgem lideranças no horizonte, mas ou são frágeis ou inúteis. A excepção é o individual, na pele de um amigo de ocasião. Os agregados estão definitivamente excluídos. Apenas 15 minutos de filme se passaram.
O tal amigo, Frank, é, nesse breve olhar, uma versão de John Nada, porém acomodada, identificado com e estabelecido na margem. Logo numa das primeiras conversas, Carpenter expõe as fragilidades desses olhares fugazes, pois os papéis parecem trocados. Frank expele bílis e clama por actos violentos contra os donos do sistema como resposta necessária, enquanto John, num plano-próximo do rosto melifluamente iluminado em tons lavanda com as torres da baixa em pano de fundo, diz que acredita na América, e que por essa razão cumpre as suas obrigações. E quando um rebelde adverte contra os perigos do sistema na televisão através de um sinal pirata, o seu olhar é de desdém (não só pelo rebelde, mas também pelos outros zés ninguéns, nos quais intui uma sede irrefreável).
Mas também nele está acesa a centelha do não conformismo, ele é o não conformismo. O seu olhar é curioso. Se o rebelde na TV advertiu contra o adormecimento das massas, então depressa se verifica que John é um dos que não dorme. Frank, apesar de conformado, também não, pois rapidamente fica curioso com a curiosidade de John. Tão diferentes na aparência, mas suficientemente indivíduos para não estarem definitivamente contaminados – sim, ao nível do viral, é disso que se trata.
No entretanto, intrigado com certas movimentações à sua volta, John descobre por acaso uma caixa de cartão repleta de óculos-de-sol. Postos os óculos, a verdade! Sim, ou então o real, versão soco no estômago. Real apesar de tudo a preto e branco, pois sob um filtro – ainda não é um olhar limpo.
Onde antes via uma qualquer publicidade a um champô, uma viagem às Caraíbas ou ao novo modelo da Ford, agora lê Obedece, Compra, Consome, Conforma-te, Casa e Reproduz-te, Adormece, Rejeição do Pensamento Independente. Pior ainda, onde antes via rostos reconhecíveis agora vê um misto de rostos reconhecíveis e outros monstruosos, inumanos. A propósito, são esses os que aparentam melhores condições de vida. Em cada nota de dólar, duas palavras: Nova Religião.
Há pouco tempo para a surpresa e ainda menos espaço mental para lidar calmamente com as circunstâncias.
Entram as armas em jogo, afinal, como alguém dirá um pouco mais à frente, “No, you have two guns. You're not sorry. You're in charge”. De arma na mão, John imediatamente confronta os seres monstruosos (aliens conquistadores, digamos), conseguindo pequenas mas saborosas vitórias (mais nossas, das nossas expectativas enquanto espectadores ideais, do que dele, em abono da verdade), até que volta à estaca zero traído por um dos seus (dos nossos).
Resta-lhe Frank…
O jogo, e sobre isso já se levantou a ponta do véu, nunca é inteiramente congruente, o que é parte não despicienda do seu fascínio. Desde que o aceitemos, como aceitamos as nossas contradições (ou seja, o humano livre ou potencialmente livre como espaço intrínseco de dissonância). Sob a aparente simplicidade de processos, pois parece que estamos sempre a ver de acordo com as nossas expectações, anseios talvez seja melhor palavra – excluindo John Nada desta equação, apesar de tudo, pois também serve de farol –, as personagens livres ou potencialmente livres não param de contrariar actos anteriores. As que não são livres, não contam, só esperam pelo momento certo ao preço certo. É também de compra e venda que trata este filme.
Veja-se o caso de Frank, que podendo excluir-se e continuar a sua vida longe do alvoroço, apesar de não aceder ao pedido de ajuda numa primeira investida, acaba por ir ter com John (já wanted man), levando-lhe one week’s pay, the best I can do. O vício da curiosidade… É o mesmo que resiste até ao limite das suas forças a ver, a olhar a realidade de frente – E a célebre cena de luta entre Frank e John no beco imundo é mesmo umas das melhores da história do cinema feito e por fazer. Longa (5.30 minutos), sem cedências, sangrenta, devidamente condimentada com expressões para a lenda, sonora.
Claro que uma vez observada a suja realidade, logo se junta à demanda, como o fazem todos os homens bons em todos os filmes (bons e menos bons).
E a partir desse momento são dois, doridos e ensanguentados, de armas em punho. Cada um a fingir que precisa de um master plan, simplesmente desejosos de encontrar uma aberta ou uma parede que possam derrubar. Filme bélico por excelência, como tantos de Carpenter, que faz transbordar os vícios intrínsecos de uma certa América (que terá começado nos anos 50 e atingido o zénite nos anos 80), é também o sonho-molhado de vingança dos Zés Ninguéns.
Mas para quê? Com que objectivo? Haverá salvação ou hipótese de redenção algures? Não, este é um filme de John Carpenter. É um caminho solitário. Eles, aliens e colaboracionistas, já dominam o show por completo. Destruir para expor é a opção. Morrer de dedo médio em riste com um sorriso nos lábios.
A individualidade responsável implica condição de pertença. Não existindo esta, não há dever moral dos Zés Ninguéns para com a Sociedade. Muitos não concordarão, fieis ao sonho da Humanidade. Chesterton, por exemplo, como digno representante de uma SMLED, i.e., uma Sociedade Moderna Livre de Eventos Drásticos, para bem dos seus débeis pecados, haveria de detestar certos filmes de John Carpenter, e disso retirar o parco e singelo prazer de um dia de reflexão.
Quanto a Carpenter, They Live, obra-prima absoluta, servira de aquecimento, anos depois iria ainda mais longe, em Escape from L. A. (1996), dando ao seu protagonista, call me Snake, a hipótese de sobreviver, substituindo o dedo médio em riste por um valente pontapé no cu do Mundo.
São só filmes, não se preocupem.
...clérigos sedentos de sangue de virgens se juntam com génios estáveis, gulosos de poder, e nos atiram testosterona e cobardia para a cara (nas salas de reunião dos respectivos paços do concelho não se morre a não ser de tédio), apetece atirar a matar. E se algum prazer se pudesse tirar disso, enfim, como o génio estável até faz pior figura...
Passado um instante, consciente do absurdo, apetece ser...didáctico - mas como esclarecer com eficácia?
Talvez assim:
Vá lá, crianças grandes, deixem de brincar às guerras e aos führers, que as pequenas é que pagam.
Um universo delirante para além de Chaplin, Buster Keaton e Harold Lloyd...
Se bem que, num mundo com Federer, Nadal e Djokovic, quem quer ser o Andy Murray?
Não é preciso responder.
Ou a Balada Tranquila no Inferno.
Terrence Malick dirigiu dois filmes nos anos 70 do século passado e depois desapareceu durante 20 anos. Duas obras-primas absolutas: Badlands (1973) e Days of Heaven (1978).
Detestava as luzes da ribalta (a mundanidade) ao mesmo tempo que pretendia criar uma relação especial (e, sim, mitológica) com a natureza.
Vê-lo nos anos 90, após o seu regresso ao cinema, era ver uma única foto na rodagem do seu então terceiro filme, The Thin Red Line (1998). Rever Badlands é tudo e tanto quanto se queira, já que falamos de absolutos, logo também relembrar aquele tipo de chapéu à cowboy com ar introvertido e de frágil e infinita nobreza, que mais ou menos a meio do filme escapa à vertigem assassina de Kit sem saber quão perto esteve da morte; precisamente o tipo habitualmente por trás da cortina, o grande Terry Malick (familiaridades são necessárias) ...
Quanto ao filme, digamos que um passeio pelo Inferno nunca deveria ser uma história de amor. Nunca deveria ser o mais belo dos filmes (e há uns quantos assim). Nunca os extremos, polícia vs. assassino, se deveriam respeitar desta forma.
Enfim, …a não ser que os seres se reconhecessem como semelhantes perante o abismo, por cuja borda todos caminhamos e onde um ou outro cai antes de tempo, proximidade pela consciência do ínfimo ante a plenitude. Dínamo gerador de uma profunda perplexidade que se transfigura em poesia pela visão do criativo, do artista - que felizmente abusa dessa prerrogativa.
Não há filmes como os de Terrence Malick. Já não havia nos idos 70.
Pelos vistos, em 1981 o noir já não era o que era.
Veja-se o final de Body Heat, o primeiro filme dos muito, muito estimáveis (no respectivo campo) Lawrence Kasdan e Kathleen Turner. Porquê a cena final na ilha paradisíaca quando já o sabíamos do livro de curso? Para quê a musicalidade das imagens sobrepostas? Para simples efeito? Afinal, tudo se resumia a Ned / William Hurt e à sua perda infinita, e era nesse olhar que devíamos ter ficado - para sempre.
Jacques Tourneur e Otto Preminger, dois dos meus bons amigos das noites da RTP 2 dos 90 do século passado, jamais cairiam numa tão óbvia esparrela.
Dziga Vertov, nome artístico de David Kaufman, significa, à letra, Pião, pião que rodopia – de que serviria se assim não fosse? Compreende-se a escolha. Enquanto cineasta (e não é crível que Vertov se visse como tal), recusava a colagem às artes antecedentes, literatura e teatro. Não queria um cinema cujos tempos fossem geridos por intertítulos e recusava a ficção como fonte primária de alimento.
O Cinema-Olho que, enfim, intuiu era a ampliação de um olhar. Do olhar humano para um olhar superior, o olhar do super-herói, demiurgo, regulador da experiência, olhar controlador ajustado pela plenitude. Olhar feito de olhos vários e digressivos; o humano, o maquinal, passando pelo olho-metáfora: os olhos dos moscovitas, o olho da câmara, a montagem que une, desvia, reúne, sem apartar irreversivelmente. O todo não é soma, mas reunião e intersecção, sobrevindo a técnica como o óleo que permite uma condução sem sobressaltos.
Encontrarão nestes breves 66 minutos todos os planos que os sonhos e a intuição vos permitam, um dilúvio de efeitos ópticos e não há campo que fique fora do olhar-do-filme. Cada ponto-sujeito encontra o seu reflexo, sendo que não há ‘outro lado espelho’ para transpor, o olhar-do-filme é, digamos, totalmente abrangente – o olhar absoluto de uma dimensão superior.
Posteriormente, outros também o alcançaram (homens como Hiroshi Teshigahara, em The Face of Another (1968), e Oliver Stone, em Natural Born Killers (1994)), porém não se inventa a roda duas vezes.
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