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Se os três mosqueteiros são sempre quatro, então os sete magníficos da geração que se seguiu à dos Sete Magníficos (e no que diz respeito aos espíritos analistas já inclui os filhos e os netos desta) são sempre seis. Falamos de actores de cinema, é claro, mas também de contexto afectivo e consciência universal.
Quem são?
Robert Redford (nascido a 18/08/1936 – 82 anos)
Robert De Niro (nascido a 17/08/1943 – 75 anos)
Jack Nicholson (nascido a 22/04/1937 – 81 anos)
Al Pacino (nascido a 25/04/1940 – 78 anos)
Harrison Ford (nascido a 13/07/1942 – 76 anos)
Dustin Hoffman (nascido a 08/08/1937 – 81 anos)
Hipérbole: Todos vivos!
Quanto a quatro deles, os do meio, tornaram-se no que foram (e são) no tempo da New Hollywood (ainda que um deles pouco ou nada tenha dado para esse peditório, quem sabe se olhando para os cantos, onde estala o chicote), entre, digamos, 1969 e 1982; logo, ao serviço da última vaga de realizadores americanos (a trabalhar na América e todos americanos) suficiente e sinceramente iludidos com a exigência desse modo especial de estar no cinema, i.e., criar o último filme clássico de Hollywood. Dos outros, um já era gente grande antes desses gloriosos fins de sessenta de 1900, e o outro fazia de grande, sendo o símbolo do pequeno-grande – a Anne Bancroft que o diga (Robert Redford e Dustin Hoffman, por esta ordem, pois claro; eles que mais tarde acabariam por se juntar nessa lança tão desencantada quanto necessária no coração da América que foi All The President’s Men, de Alan J. Pakula).
Todos vivos e envelhecidos, mas diga-se que nenhum perdeu verdadeiramente o pé. Robert De Niro parece ter-se desinteressado a certa altura – logo ele que é o intérprete da melhor representação contida da história do cinema, o Mike Vronsky de The Deer Hunter (esclareça-se: até lhe morrer nas mãos o melhor amigo). Assim como Al Pacino tem o melhor desempenho endiabrado, em …And Justice For All, de Norman Jewison, filme apenas assim-assim, para que saibam (e nenhum outro actor se poderia safar desta forma naquele filme), e Jack Nicholson a melhor interpretação retorcida, em The Shining, de Kubrick, e acrescente-se que também nenhum outro actor se teria conseguido safar assim…tão facilmente - isto salvo melhor opinião.
Todos vivos! E quase nunca simples heróis – muito menos Deckard.
Exemplos:
(Picnic at Hanging Rock)
(Peter Weir, 1975)
Um mistério (ousemos dizê-lo) não vive em nós, ditos pensantes, no pressuposto da sua resolução; pelo contrário, seres ditos pensantes querem-no para sempre misterioso, seja por deontologia, seja por temor; duas manifestações, afinal, muito humanas, ainda que apenas uma nos acompanhe desde o instante zero. O mistério dirige-se para o impalpável, e claro que nada nos deveria ser pedido perante o mistério; nada para além da sua contemplação ou, em certos casos muito particulares e de preferência com a duração do microssegundo, bem entendido, algum reflexo incondicionado de autodefesa.
O mistério, se resolvido, como tão bem sabem os que conhecem o cinema americano (e o cinema, como tão bem sabemos todos, é o meio instrutivo de excelência das últimas dez gerações), apenas pode redundar no vazio da imbecilidade (escusemo-nos a exemplos, tantos são) ou no horror absoluto (basta recordar, ah! – arrepio fantasmático semelhante ao frio da morte, Seven e Chinatown). E mesmo esses, enfim, reconheça-se que não são verdadeiros mistérios, antes enigmas ao alcance (ainda que para mal dos seus e dos nossos pecados) de qualquer detective talentoso e perseverante.
Essa não-resolubilidade sistémica do verdadeiro mistério é o modelo de, por exemplo, Tarkovsky. Homem contemplativo e fascinado pelo que não se desvenda, ou seja, desejoso de não descobrir. Homem de enorme talento.
David Lynch também abraça o mistério, mas gosta de se colocar como deus, mesmo se menor: oferece-nos o mistério irresolúvel, porém como se soubesse o que mais ninguém sabe. É uma perspectiva como outra qualquer, perdoável por vir de um deus provocador. Amamo-lo de igual modo, ou mais ainda.
Dito isto, o mistério também deve ter o seu quê de longínquo, o que lhe confere poesia. Não é só. Não simplesmente. Se o mistério é por definição inexplicável, também é conveniente que contenha elementos exóticos, mas diferenciáveis. Por outras palavras, o outro lado do Universo é bem menos eficaz como ponto de partida do que a nossa querida Austrália. A um podemos ir a outro não, apesar de ambos se encontrarem no outro lado de.
Talvez por isso, do que o cinema nos ofereceu nas últimas décadas, somos levados a acarinhar de modo especial o mistério contido no assombroso filme de Peter Weir, Picnic at Hanging Rock. Na aparência: filme sobre o desaparecimento de três alunas e uma professora na Austrália, no dia de São Valentim – em 1900, durante um piquenique junto ao rochedo nomeado no título.
Muito brevemente sobre o filme:
- Cada elipse, neste filme de elipses, tem a dimensão figurada da eternidade.
- Filme sem heróis nem heroínas, apenas os que se deleitam perante o mistério e os que o temem (estes últimos, tolos, dividem-se por sua vez em dois grupos: os que o querem resolver e os que fingem que o mistério não existe).
- Muda constantemente de ponto de vista; e não, não é a câmara, enquanto elemento exterior, que se fixa constantemente nas diferentes personagens, antes se coloca milagrosamente no olhar de cada uma delas. Olhar atomizado e capaz de querer, mas, por todas as razões expostas anteriormente, incapaz de progredir para lá de um certo ponto.
- Certas personagens, de entre as deleitadas, falam como anjos, i.e., (como se) num nível de compreensão superior.
- Como se pode ver pela professora também desaparecida, a razão não faz com que se esteja mais próximo de qualquer resposta (caso inutilmente a pretendêssemos).
- A certa altura, uma das alunas desaparecidas reaparece nas proximidades do rochedo. Não se recorda de nada, passa a viver como se imersa num êxtase, espécie de sopa imemorial de tanto (tudo o) que a transcende, sendo que nada resta para nós, que nunca atravessámos…a fronteira. Eventualmente foi ejectada de volta para o mundo real (e como arriscamos ao dizer tal!), pelo que a inocência também não é atalho, nem sequer a sua hipótese.
- Pelas duas últimas notas: eis, portanto, um filme que não nos falha.
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